Uma cultura de violência e personalismo na política ainda marca os jovens Estados africanos
Por Denise Galvão
Há décadas o continente africano é vítima
de uma coincidência dramática: conflitos armados e pobreza. Como as
guerras não estão presentes em todos os contextos de miséria, conclui-se
que a pobreza nem sempre é capaz de causar conflitos violentos por si
só. Apesar disso, deve ser observada como uma causa – ela contribui de
maneira decisiva para que as guerras aconteçam.
Grupos insurgentes costumam alegar que
querem substituir um determinado governo para que, com o poder em mãos,
possam defender segmentos marginalizados da sociedade em regimes
nãodemocráticos. Afirmam que a idéia é conferir-lhes expressividade
política e promover seus interesses sociais e econômicos, a fim de
reverter injustiças. Essa motivação costuma atrair amplo apoio popular à
iniciativa de travar uma guerra civil.
No decorrer de vários conflitos na
África, porém, os combatentes empregaram táticas de guerra, como o
recrutamento de crianças, a servidão sexual, as mutilações de civis, o
deslocamento forçado e a limpeza étnica. Quando rebeldes voltam-se
contra a própria população, torna-se evidente que há outros fatores
envolvidos, além da luta contra a marginalização.
As causas fundamentais desses conflitos
estão, em geral, relacionadas à fraqueza e à pouca – ou nenhuma –
legitimidade dos governos. Uma cultura de violência e personalismo na
política ainda marca os jovens Estados africanos, herdeiros do domínio
colonial europeu. Essa fragilidade manifesta-se no caráter vulnerável a
intervenções internacionais e na permissividade ao mercado informal, que
possibilita a circulação de armas ilegais. Ao agir em nome de
interesses privados, o Estado permite que outras forças políticas –
incluindo grupos armados – preencham o vácuo do poder público.
Foto daqui (Burundi)
É interessante notar que na África há um
paradoxo entre a pobreza do povo e a riqueza da terra. Ao mesmo tempo em
que o continente concentra os piores índices de desenvolvimento humano,
também tem reservas de extraordinárias riquezas naturais, como
petróleo, diamantes, ouro, cobre, cobalto e coltan (liga metálica usada
na fabricação de componentes eletrônicos). Parte dessas riquezas foi
drenada para financiar a violência contra as próprias populações
africanas – como, por exemplo, os “diamantes de sangue” de Angola, Congo
e Serra Leoa. Outra parte enriqueceu grandes investidores estrangeiros,
com as bênçãos de governos instáveis e corruptos.
Conflitos prolongados e de difícil
solução, como é o caso dos países que compõem o Chifre da África, não só
causaram mortes, mas também pioraram as condições de vida dos
sobreviventes – entre os quais imensas massas de refugiados. Dessa
forma, percebe-se claramente a correlação entre miséria e conflitos
armados: ao mesmo tempo em que a miséria consiste em uma causa profunda
de guerras, também é intensificada pelas práticas de extrema violência,
num ciclo vicioso dos mais cruéis.
Denise Galvão é mestra em Relações
Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e integrante do Grupo
de Análise de Prevenção de Conflitos Internacionais da Universidade
Cândido Mendes.
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